Elizandra Aparecida Nóbrega/abril 16, 2020.
Em setembro de 1905, o Vale do Ribeira recebeu a visita do Dr. Carlos José de Arruda Botelho (1855-1947), então secretário da Agricultura e um dos políticos paulistas mais ilustres de seu tempo, que foi festivamente recebido em Iguape, Pariquera-Açu, Jacupiranga e Xiririca (Eldorado).
Dr. Carlos Botelho.
Para homenageá-lo a Câmara de Iguape realizou uma série de solenidades, que contou com a participação de muitas autoridades e pessoas importantes da cidade. O objetivo da visita do Dr. Carlos Botelho era percorrer o município (então composto por vários distritos, hoje emancipados, como Pariquera-Açu, Jacupiranga, Juquiá) e estudar os meios de desenvolver novas fontes de riquezas e maior povoamento do solo.
Para receber à altura o importante visitante, a Câmara autorizou o intendente municipal, major Joaquim José Rebello, a despender a quantia de um conto de réis, a título de propaganda agrícola, mandando ainda imprimir mil exemplares da brochura intitulada “A excursão oficial do sr. dr. Carlos Botelho, digníssimo secretário da Agricultura, à zona da Ribeira de Iguape”.
O Dr. Carlos Botelho veio de trem de São Paulo a Santos, e pegou a estrada da marinha em direção a Iguape, viagem que durou quatro dias. Chegou à Jureia no dia 16 de setembro, passou pelo porto de Una e pernoitou na Vila do Prelado com sua comitiva, que era composta pelos engenheiros Guimarães Carneiro, da Inspetoria de Estradas de Ferro e Navegação; Lourenço Granato, inspetor da Agricultura; Haraldo Egydio, fotógrafo do Instituto Agronômico de Campinas; e Jonas Novaes, engenheiro do 7º Distrito de Obras Públicas.
No dia seguinte, a comitiva dirigiu-se ao porto do Suamirim, onde tomou a embarcação que a conduziria à Barra do Ribeira. Note-se que o trajeto do Prelado ao Suamirim foi feito a pé. Na Barra do Ribeira, já esperava o vapor “Cândido Rodrigues”, tendo a bordo o chefe político de Iguape, coronel Jeremias Júnior.
Chegada de Carlos Botelho no Porto Grande, em Iguape.
Na manhã do dia 17 de setembro, um belo e ensolarado domingo, as ruas de Iguape amanheceram engalanadas, vendo-se “bandeiras e galhardetes em profusão”. No Porto General Osório elevava-se um magnífico arco triunfal com a dedicatória: “Salve, ilustre hóspede!”.
Na entrada da rua 9 de Julho (então rua 20 de Setembro), outro arco com os dizeres: “A cidade de Iguape ao dr. Carlos Botelho”. E, no cruzamento da rua XV de Novembro, em frente ao Paço Municipal, um primoroso arco, trabalho em alto relevo do pintor iguapense Júlio Barnabé Dias, que também construiu os dois primeiros arcos, lia-se: “Homenagem da Câmara Municipal ao exmo. sr. dr. Carlos Botelho, muito digno secretário da Agricultura”.
Na entrada na rua Tiradentes, com fundos para a Praça Duque de Caxias, avistavam-se dois caprichosos arcos, onde se liam as inscrições: “Ao dr. Carlos Botelho. Homenagem dos moradores da rua Tiradentes. Salve!” e “Ao dr. Carlos Botelho, Homenagem do povo”.
Ao passar o vapor pelo Porto do Ribeira, os apitos dos engenhos de arroz “Central” e “São Theodoro” se fizeram ouvir. Ao chegar à sede da cidade, apitaram os engenhos do coronel Zacarias Teixeira e do capitão João Hipólito Gato. O maestro Joaquim José Rebello, que era o Intendente Municipal, regendo a banda musical Euterpe Paulista, tocava o dobrado “Coronel Aquino”.
No Porto Grande, compacta massa aguardava o desembarque do ilustre visitante. O Dr. Carlos Botelho e comitiva, acompanhado dos políticos iguapenses e do povo em geral, subiu o beco do Porto, entrou no Largo da Matriz, fez uma volta em frente à Matriz, encaminhando-se à rua 20 de Setembro (9 de Julho), e chegou à rua XV de Novembro. O secretário ficou hospedado num aposento do Paço, que foi especialmente mobiliado para ele.
AS HOMENAGENS
Recepção a Carlos Botelho, na rua 9 de Julho, em Iguape.
Teve sessão solene da Câmara Municipal em sua homenagem, com a presença dos vereadores Jeremias Júnior, capitão José de Sant´Anna Ferreira, major Joaquim José Rebello, capitão Carlos de Souza Castro, major João Baptista Moutinho e capitão Manoel de Andrade e Silva. Entre os assistentes, destacavam-se, entre outras, as figuras do padre Domingos de Lemos, coadjutor da Paróquia de Iguape, tenente-coronel Antônio Jeremias Muniz, capitão Eurico Moutinho, capitão Júlio Fernandes de Aquino, capitão Luiz Gonzaga Muniz e o professor José Bueno da Veiga Júnior.
O sr. Arthur de Oliveira Santos, oficial do Registro Civil local, em nome da Câmara Municipal, proferiu eloquente discurso, saudando a presença do ilustre visitante. Em seguida, falou o poeta Leite de Magalhães, que ofereceu ao secretário da Agricultura dois exemplares de um acróstico de sua autoria, lendo-o antes da entrega:
D ignai-vos receber bondosamente,
C onspícuo cidadão – de todos querido,
A s homenagens que, espontaneamente,
R everente vos traz Iguape – unido!...
L astimando não ser um eloquente
O rador, me propus, – devanecido,
S audar-vos n'um Soneto, ousadamente,
B isonho... dissonante... mal medido!
O povo pois, por mim, Senhor Ministro,
T razer-vos vem as suas saudações
E neste mau Acróstico as registro...
L embrai-vos todavia que uma aliança
H oje convosco faz – entre ovações,
O povo, – de quem sois toda a esperança!...
Seguiu-se com a palavra o sr. José Pedro Meirelles e o Dr. Ferreira Machado, promotor público da Comarca de Iguape. Os alunos do Grupo Escolar, Octacílio da Rocha Muniz, filho do capitão Francisco Rocha, juiz de paz; e Onésio França, filho do tenente Hermelino França, pronunciaram, “com muita inteligência e desembaraço, discursos de saudações ao homenageado”, oferecendo-lhe buquês de flores naturais. Os oradores foram entusiasticamente aplaudidos pelos presentes.
O aluno Onésio França recitou os versos:“Senhor: Estas lindas flores
Podem falar-vos por mim,
Os meus francos louvores
Neles trazer-vos eu vim.
Destas cândidas mãozinhas
Uma a uma as fui colher,
São perfumosas boquinhas
Que vós podeis entender.
Dizem – carinho, ternura,
Saudade, amor, gratidão;
São delicadas e puras,
Como o nosso coração!!!”
Agradecendo a feliz acolhida, o Dr. Carlos Botelho, num longo discurso, prometeu desenvolver esforços para o desenvolvimento da lavoura e da educação técnica de pessoal para a região. Disse que, com a distribuição de sementes pela Secretaria da Agricultura, a produção do arroz de Iguape aumentou extraordinariamente naquele ano. Terminado o discurso, o Dr. Carlos Botelho foi calorosamente aplaudido pelo público presente.
À noite, houve um concorrido jantar na residência do coronel Jeremias Júnior (onde, mais tarde, funcionou o Club XV, depois 25 de Janeiro e, atualmente, a Casa Paroquial).
O menu foi “Riz a la iguapense”, com finos vinhos e licores.
Ao sair da residência, o Dr. Carlos Botelho foi acompanhado por uma passeata que percorreu as principais ruas da cidade, ao som da banda Euterpe Paulista e sob o espoucar de “multicores fogos cambiantes, o que deu grande realce à passeata”.
As ruas se achavam todas iluminadas por lampiões a querosene, e por onde passava o Dr. Carlos Botelho o povo saudava entusiasticamente o seu nome. O secretario pernoitou no Paço Municipal.
No dia seguinte, 18 de setembro, pela manhã, o Dr. Carlos Botelho foi ao Aprendizado Agrícola “Dr. Bernardino de Campos”, instalado em 1903 pelo Dr. Lourenço Granato, visitando as salas e as culturas existentes no Campo de Experiências. Daí seguiu para a Fonte do Senhor, onde visitou o reservatório de água e manancial que abastecia a cidade, “apreciando muito o lugar que é realmente pitoresco”.
Em seguida, almoçou na residência do coronel Jeremias Júnior. Depois, a bordo do vapor “Bento Martins”, seguiu para a Vila de Subauma, onde foi recebido pelo coronel Félix Biallé, também vereador.
Recepção a Carlos Botelho, na rua XV de Novembro, em Iguape.
Depois, partiu para a ex-colônia de Pariquera-Açu, onde foi recepcionado pelas autoridades locais, entre os quais, Romeu Monti, Casimiro Lino Alves Vieira, Estanislau Cugler e Ângelo Simonetti. O Dr. Carlos Botelho pernoitou em Pariquera-Açu.
Na manhã seguinte, 19 de setembro, o Dr. Carlos Botelho seguiu para a Freguesia de Jacupiranga, onde foi recebido por grande massa popular e por autoridades, entre as quais, tenente João de Sant´Anna Ferreira, tenente Jorge de Lima e coronel Antônio Pinto de Magalhães Mesquita, o fundador da Freguesia.
À tarde, o secretário da Agricultura partiu para o município de Xiririca (Eldorado), sendo recebido pelo coronel Joaquim Brasileiro Ferreira. Pernoitou em Xiririca.
No dia seguinte, 20 de setembro, Carlos Botelho visitou a célebre fazenda Santo Antônio do Caiacanga, de propriedade de Franz Meindl. Depois do almoço, passou pela Barra do Juquiá, “paragem encantadora da Ribeira”, seguindo, então, em direção ao Porto de Iguape.
Às 23h, depois de outros programas na cidade, Carlos Botelho recolheu-se ao vapor “Cândido Rodrigues”, onde pernoitou, pois a embarcação sairia às 2h em direção à Barra do Ribeira. Daí, após de vários dias de viagem, o secretário da Agricultura chegava à Capital do Estado.
ROBERTO FORTES, historiador e jornalista, é licenciado em Letras e sócio do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. E-mail: robertofortes@uol.com.br
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