Há 50 anos, um acidente automobilístico cerceou, talvez, a mais brilhante carreira política de Capão Bonito.
O jeito carinhoso de tratar as pessoas, a paciência em ouvir, a forma educada de se relacionar, são algumas das características que alguns ainda conservam do médico que governou Capão Bonito no início da década de 60.
Em agosto deste ano marca os 50 anos da morte de uma das principais personalidades que o município já conheceu, quer seja no campo da política ou da medicina: Raul Venturelli.
O capitalismo que hoje impera numa das mais belas profissões humanas, jamais contaminou Raul Venturelli. Como médico, procurou honrar o juramento de “cuidar da saúde das pessoas”.
A vaidade passava longe de sua conduta de vida. Não foram poucas as vezes que atendeu no meio da rua.
Era mais que um médico: era amigo, conselheiro, quase um membro das milhares de famílias que o admiravam.
De família tradicional, corria em suas veias o sangue de políticos.
Filho do ex-prefeito João Venturelli e de Arthulívia Mendes, conviveu de perto com as acirradas disputas políticas entre sua família e a de Oscar Kurtz Camargo.
A cidade quase que se divida ao meio. De um lado os oscaristas e de outro os venturelistas.
Raul nasceu em 10 de maio de 1922 e com apenas 13 anos de idade, conquistou seu primeiro diploma, formando-se no antigo Grupo Escolar, hoje escola Jacyra Landim Stori.
Em 1940, concluiu o primeiro ano do curso secundário obtendo nota máxima em todas as disciplinas.
Aproveitou a rápida passagem pela vizinha Itapetininga para cumprir com suas obrigações militares. Serviu o Tiro de Guerra e de lá trouxe a experiência cívica da disciplina militar.
No ano seguinte, trocou novamente de cidade.
Da terra das escolas foi para o norte paulista e concluiu o segundo ano do ensino secundário na cidade de Ribeirão Preto.
Novamente se destacou pela dedicação aos estudos e recebeu diversos prêmios oferecidos pela direção da escola que abrigou o capão-bonitense.
Faltava mais um ano para receber o diploma do hoje Ensino Médio. Para isso, trocou o ar de Ribeirão Preto pelo de Curitiba, capital do Estado do Paraná, onde se formou pelo Colégio Paranaense. Novamente foi um dos destaques da turma de formandos.
Na cerimônia de entrega dos certificados, como orador, soube usar as palavras corretas e precisas para emocionar a plateia presente, que não poupou palmas e saudações ao jovem brilhante nascido em Capão Bonito.
Além da familiaridade com o mundo do conhecimento, Raul Venturelli tinha outras virtudes: demonstrou coragem e ousadia ao reunir centenas de jovens e moradores na praça Rui Barbosa em plena Segunda Guerra Mundial.
Usou seu farto vocabulário e sua boa argumentação para ressaltar a importância de servir à Pátria em momentos cruciais como aqueles.
A medicina
Para realizar o sonho de servir ao próximo e cuidar de pessoas como médico, foi buscar aprimoramento no Colégio Pan-Americano de São Paulo.
Foram três anos – de 44 a 47 – dedicando-se, dia e noite, aos livros e cadernos especiais que continham as informações requisitadas nos vestibulares de medicina.
Foi aprovado com excelente classificação na Faculdade de Medicina de Curitiba, onde permaneceu por quatro anos. Pediu transferência para concluir o curso na Faculdade Paulista de Medicina, onde em 1952 recebeu o tão sonhado título de médico, o primeiro médico nascido em Capão Bonito.
Como médico trabalhou em diversas cidades como São Paulo, Bauru e retornou definitivamente para sua cidade natal em 1957.
Em Capão Bonito, a atuação médica de Raul Venturelli ia muito além do consultório. Era conselheiro, amigo e atendia o povo no meio da rua. Seguia à risco o juramento de Hipócrates, que os médicos fazem ao receber o diploma: ˜Salvar Vidas˜.
Católico praticante, era defensor da medicina social, aquela mais voltada às famílias carentes.
A política
Em menos de dois anos como médico, conquistou a admiração da população e uma legião de admiradores, e isso, o credenciou para mais um desafio: disputar as eleições para prefeito de 1959 contra um leão da época, o ex-prefeito Oscar Kurtz Camargo, que também carregava grande aprovação e respeito na cidade.
Como diz o velho ditado: “Eleição não é época de plantar e sim de colher”, e foi com a mesma humildade de médico que se elegeu o prefeito mais jovem da cidade, ate então.
Foi um prefeito diferenciado para os padrões da época. Trocou o conservadorismo pela inovação.
Primeiro buscou parcerias com o Governo Estadual.
A postura, a fala e o conhecimento do prefeito capão-bonitense abriram as portas do gabinete do governador paulista da época, Carvalho Pinto.
Seu bom trânsito nas esferas governamentais trouxe bons investimentos para Capão Bonito.
Porém, também foi durante o mandato de Raul Venturelli que a cidade sofreu um dos maiores golpes econômicos de sua história: a mudança do fluxo rodoviário que atravessava a cidade na época e trazia bons dividendos na época, para a BR 116, a famosa Regis Bittencourt. A economia de Capão Bonito adoeceu, e sua recuperação demorou décadas.
A tristeza se agravou com mais um duro golpe.
Um trágico acidente de automóvel tirou a vida do promissor prefeito.
Raul Venturelli viajava constantemente a São Paulo em busca de recursos para o seu município, e numa dessas viagens, mais precisamente no dia 16 de agosto de 1962, numa tarde de garoa fina, veio a perder a vida.
Foi um dos dias mais tristes da história de Capão Bonito.
Entristecida, a população lotou o velório para a última despedida.
Capão Bonito chorou longos anos a perda daquele que foi muito mais que um médico ou prefeito: foi um missionário que tinha como único objetivo de vida servir a quem precisasse de sua ajuda.
A comoção da morte do prefeito promissor comoveu toda a cidade, até que um gesto de reconhecimento, o educador Laudelino de Lima Rolim, então diretor do Ginásio Estadual, acampou um movimento para denominar a escola mais importante da cidade, em Colégio Estadual Raul Venturelli (CERV), eternizando desta forma o nome desta personalidade histórica.
Ao carregar o nome de Raul Venturelli, a escola também traz o exemplo de um homem que foi à frente de seu tempo. Um político de visão ampla, com boa oratória, e principalmente, com a devida humildade para exercer a profissão de médico. Tudo isso o credenciou na época para assumir a Secretaria de Estado da Saúde do ex-governador Carvalho Pinto.
Não deu tempo, porém, seu nome fortalece o certificado de milhares de homens e mulheres, de cidadãos e cidadãs, que de simples estudantes, hoje são pais e mães de família, profissionais renomados, que passaram pelo Colégio Raul Venturelli.
Aos estudantes de hoje, fica o exemplo de humildade e dedicação para conquistar um diploma e o reconhecimento profissional.
E para se inspirar, basta um olhar diferenciado no retrato de Raul Venturelli.
FONTE: Blog do Francisco Lino, em 24 de abril de 2015.
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