Ele era um preto retinto, mas era o preto mais puro que já conheci, tal era a beleza de sua alma.
Já era entrado em anos, porém, sempre jovem, com um sorriso bonito, permanentemente solto nos lábios grossos; sorriso de gente feliz porque não tinha maldade na alma.
Já era entrado em anos, porém, sempre jovem, com um sorriso bonito, permanentemente solto nos lábios grossos; sorriso de gente feliz porque não tinha maldade na alma.
Chamavam-no também de “NHO”.
Tinha sua profissão, que nunca eu soube qual era. Mas havia uma outra profissão na qual era artista.
Tinha sua profissão, que nunca eu soube qual era. Mas havia uma outra profissão na qual era artista.
Era artista para tanger os sinos da matriz. E como os tangia... Quando o sonoro sino grande deixava evolar nos ares seus sons, a gente já sabia quem o tangia.
Era ... o “NHO”.
E nesse tanger, nesse repicar ele punha toda a sua alma, toda a sua emoção, toda a doçura do seu grande e resplendente coração.
E nesse tanger, nesse repicar ele punha toda a sua alma, toda a sua emoção, toda a doçura do seu grande e resplendente coração.
Parecia que a beleza que morava dentro da sua alma, da sua doce alma, transportava-se para os sinos todos, a dizer através dos ares, enchendo a terra toda, que ele amava a cidade lá embaixo e o seu bom povo.
E esses sons iam de quebrada em quebrada, a dizer sonoramente, que era verdade esse bem querer...
Havia uma festa? Pelo toque do sino, a gente sabia que era preciso ficar alegre e todos se alegravam...
Havia uma festa? Pelo toque do sino, a gente sabia que era preciso ficar alegre e todos se alegravam...
Como não? O “Dito” estava mandando os sons, como prelúdio de alegria...
Quantas vezes, ouvi minha mãe dizer:
- Escute! Que homem será que morreu? Dito Geraldo está tocando...
- Mas, mamãe, dizia eu, como sabe a senhora se é um homem ou mulher quem acaba de deixar este mundo?
- Ora, respondia, ela, pelo toque do sino a gente sabe. O Nhô avisa!
- Escute! Que homem será que morreu? Dito Geraldo está tocando...
- Mas, mamãe, dizia eu, como sabe a senhora se é um homem ou mulher quem acaba de deixar este mundo?
- Ora, respondia, ela, pelo toque do sino a gente sabe. O Nhô avisa!
E assim todos sabiam se era homem, mulher ou anjinho, que Deus havia chamado para si.
Na semana santa, o povo era mais contrito, mais triste; o Dito Geraldo punha através dos sinos, mais religião, mais emoção, mais tristeza e arrependimento no coração do povo.
Era insubstituível.
Quando alguém se propunha a tanger os sinos amados, em lugar do Benedito Geraldo, todos diziam: Qual... Como “ele”, não há ninguém.
Quem não conhece o jeito de repicar “dele”?
Mas um dia o Dito Geraldo morreu. Foi juntar-se aos homens, mulheres, que ele tinha acompanhado com os seus sons, até a entrada nos céus.
Quando seu corpo, levado em caixão humilde pelo povo que o amava, percorria as ruas da cidade, tantas vezes cheias de sons bonitos que ele mandava lá da velha torre, o sino permaneceu mudo.
- Como!?...alguém disse. Não tangem o sino para ele, que tanto tangeu para nós?
Quem não conhece o jeito de repicar “dele”?
Mas um dia o Dito Geraldo morreu. Foi juntar-se aos homens, mulheres, que ele tinha acompanhado com os seus sons, até a entrada nos céus.
Quando seu corpo, levado em caixão humilde pelo povo que o amava, percorria as ruas da cidade, tantas vezes cheias de sons bonitos que ele mandava lá da velha torre, o sino permaneceu mudo.
- Como!?...alguém disse. Não tangem o sino para ele, que tanto tangeu para nós?
Nesse momento lá do alto da torre, alguém fez o sino soar, chorando baixinho e dorido. Eram sons que feriam a alma; cada pancada, transpassava o coração da gente que o acompanhava até seu último pouso.
E todos choravam. Todos sabiam que com o corpo frio do querido “Nhô”, iam também os mais belos sons dos velhos sinos.
Só uma pessoa não chorava...
Só uma pessoa não chorava...
Só uma sorria desconcertada, envergonhada, talvez. Era a própria alma do Benedito Geraldo, que, envolta nas brumas do infinito, quase a sumir-se, para sempre, na voragem dos tempos, dizia:
- Mas, que diabo será aquele, que está tangendo tão mal, os meus sinos?
Transcrito do Livro "EPOPÉIA DE UM POVO", de Paulo Ferrari Massaro - editado em 1963.
- Mas, que diabo será aquele, que está tangendo tão mal, os meus sinos?
Transcrito do Livro "EPOPÉIA DE UM POVO", de Paulo Ferrari Massaro - editado em 1963.
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