sexta-feira, 25 de maio de 2018

POR QUE SERÁ QUE A FONTE DO SENHOR, EM IGUAPE, LEVA O NOME DE ALBERT CAMUS?

06/08/2005 
CAMUS E O BOM JESUS DE IGUAPE

Neste período em que Iguape vive dias de intensa agitação com a festa em louvor ao Senhor Bom Jesus, é interessante recordar a histórica visita que o escritor Albert Camus fez à cidade em agosto de 1949. Entre os dias 5 e 7, o célebre escritor argelino, Prêmio Nobel de 1957, acompanhado de Oswald de Andrade e outros amigos, veio a Iguape para conhecer de perto a centenária romaria do Bom Jesus.
Naquela época, Camus já era escritor consagrado em todo o mundo. Considerado o “profeta do absurdo” (tal como Kafka, que muito o influenciou, e Sartre, seu companheiro do movimento existencialista), Camus procurou retratar em sua obra o absurdo da condição humana. Absurdo que Kafka captou desconcertantemente em “O Processo” e, em Camus, encontramos com toda sua intensidade em “O Estrangeiro”.
Sua passagem pelo Vale do Ribeira foi registrada com detalhes no livro“Diário de Viagem”, editado pela Record. Nessa obra, Camus, com toda sua argúcia, é bastante cáustico quando considera o Brasil “um país em que as estações se confundem umas com as outras; onde a vegetação inextrincável torna-se disforme; onde os sangues misturam-se a tal ponto que a alma perdeu seus limites.”
As observações colhidas durante a Festa do Bom Jesus foram aproveitadas para escrever o conto “A Pedra Que Cresce”, inserido no livro“O Exílio e o Reino”. É o único conto ambientado no Brasil, sendo os demais desenrolados em várias partes do mundo.
Durante sua permanência em Iguape, Camus e seus amigos ficaram alojados num quarto da Santa Casa local, que foi especialmente pintado para acolher o ilustre escritor. Vale lembrar que naquela época a luz era apagada às 22:00 horas e, para não deixar o visitante na penumbra, o então prefeito mandou retirar da cama os encarregados da usina elétrica para manterem acesa a luz a noite inteira...
Na concorrida recepção que lhe foi prestada no Clube XV (que funcionava no atual prédio da Casa Paroquial) ocorreu um desagradável incidente. Um policial, visivelmente embriagado, aproximou-se de Camus e começou importuná-lo. As autoridades e os figurões da cidade ficaram indignados com tamanha petulância e, pedindo desculpas ao escritor, sugeriram que ele escolhesse a punição que deveria ser aplicada ao inconveniente policial. Camus relutou, pediu que nada fizessem ao homem, e a muito custo conseguiu que ele fosse retirado do salão sem qualquer punição, atitude que surpreendeu a todos os presentes, que ficaram admirados com sua nobreza de caráter.
Assim, retornando a São Paulo e, depois, à França, Albert Camus encarregou-se de incluir a Festa do Bom Jesus nas páginas da literatura universal. E Iguape não esqueceu o imortal escritor, pois seu nome foi dado à principal alameda da Fonte do Senhor, onde a imagem do Bom Jesus foi lavada após ter sido encontrada na Praia de Una por dois índios, em 1647.

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