quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

A DENÚNCIA DE DIONYSIO BORGES, DE LORENA.



Ofício nº 281, de 16 de setembro de 1901 
Pede arquivamento do inquérito disciplinar contra diretor (de Lorena) que teria cometido violência contra alunos.
Cópia integral da carta denúncia de Dionysio Borges e do relatório final, pelo inspetor escolar Justiniano Vianna.

Carta denúncia, de Dionysio Borges:
Exmo. Sr. Ministro do Interior:

Venho com o maior pesar trazer ao vosso conhecimento uma justa reclamação contra o atual diretor do Grupo Escolar d´esta cidade, que por ignorância ou desrespeito às leis tem exorbitado das suas atribuições, infligindo aos alunos certos e determinados castigos não previstos pelo Regulamento, conforme podereis verificar pela exposição que vou fazer.
Tendo eu um filho de 7 anos de idade naquela casa de ensino há cerca de dois meses mais ou menos fui obrigado a retira-lo em vista da natureza dos castigos que foram introduzidos ultimamente no referido Grupo, digno outrora, de melhor acatamento quando estava confiado a um moço sério e criterioso.
Imaginai que o tal senhor diretor, no dia 21 do corrente, supondo-se talvez num quartel de soldados, entendeu que o meu filho e mais outra criança da mesma idade deveriam ter como pensa disciplinar ficarem com uma carga de armas sobre os ombros, porém, na Praça Pública, isto é, em frente ao edifício em que funciona o Grupo. Essas pobres crianças como era de esperar, receberam uma tremenda vaia dos meninos e garotos que na ocasião passaram por aquele local.
Isto é um fato vergonhoso e reprovado pelos educadores criteriosos mas, infelizmente, é verdadeiro! Mas não ficou só nisto, o Snr. diretor depois de ter levado a efeito um castigo puramente aviltante ainda conservou os dois meninos no corredor do Grupo até as 4 horas da tarde, entregues aos empregados que faziam a limpeza do prédio.
Ao passo que [?] os demais professores retiravam-se para suas casas, aquelas crianças ali ficaram privadas de receber qualquer espécie de alimento.
Dizem também que o mesmo diretor já tem tido ocasião de agredir fisicamente alguns alunos cujos pais não quiseram protestar temendo, talvez, maiores arbitrariedades por parte d´esse funcionário que vai dando mau exemplo aos professores.
Acredito, porém, que tudo isso está sendo feito contras as vossas ordens porque sei perfeitamente que em casos semelhantes tendes tomado as mais enérgicas e acertadas providências contras esses abusos.
Muitos pais de família estão apreensivos com este estado de coisas, visto não encontrarem no Grupo Escolar a devida garantia para os seus filhos que estão entregues aos cuidados de um indivíduo nervoso e que não possui os requisitos precisos para o bom desempenho do cargo que lhe foi confiado. Esse diretor, em três meses apensa de exercício tem criado em redor do seu nome uma atmosfera de antipatia e de sérios ressentimentos, em vista da atitude odiosa que assumiu procurando desprestigiar os mais estimados professores d´aquele estabelecimento de ensino, os quais não aprovam suas leviandades.
Além d´estes, os Sr. diretor tem cometido outros abusos que deixarei de levar ao vosso conhecimento para não tomar muito espaço.
É possível que esse funcionário não tenha a coragem precisa para confessar a veracidade desta minha reclamação; entretanto existem testemunhas que poderão corroborar tudo quanto ficou exposto.
Certo de que a presente queixa será tomada em consideração, desde já apresento-vos os meus agradecimentos.
Saúde e fraternidade.


Exmo. Snr. Dr. Ministro do Interior
29 de agosto de 1901
Dionysio Borges

Relatório final, pelo inspetor escolar Justiniano Vianna:
São Paulo, 16 de setembro de 1901.

Designado para ir à cidade de Lorena, afim de conhecer da procedência ou improcedência da denúncia escrita apresentada pelo cidadão Dionysio Borges, contra o diretor do grupo escolar “Gabriel Prestes”, cidadão Sócrates Fernandes de Oliveira, tenho a informar-vos que após ter ouvido em forma de inquérito todas as testemunhas apresentadas pelo queixoso e de colher dados que aclarassem a denúncia com pessoas gratas desta localidade, julgo improcedente a denúncia e sou de parecer que seja a mesma arquivada.
Das testemunhas apresentadas pelo queixoso três declaram unicamente ter visto a filho de Dionysio Borges de castigo a porta do grupo com uma pequena carabina de madeira leve ao ombro. Essas testemunhas são entretanto suspeitas visto uma ser amiga do queixoso e as outras empregadas do jornal “O Município” que se tem mostrado [?] não só ao diretor do grupo como contra o mesmo grupo, devido ao fato de ter sido o seu proprietário e redator há tempos dispensado do cargo de professor substituto do grupo. Contra o depoimento destas testemunhas existem outras de vizinhos do grupo, que declaram nada ter visto. Entendendo que para a elucidação da denúncia se tomasse (sic) muitos esclarecimentos de pessoas qualificadas da localidade, dirigi quesitos aos cidadãos Cel Pádua Júnior, Intendente Municipal, Dr. Pedro de Araújo, Inspetor Municipal, Cap. Francisco Ruivo, Delegado de Polícia, Cap. Leopoldo Camargo, Coletores do Estado, Dr. Flygério de Oliveira e Antonio de Godoy Júnior, Escrivão da Primeira Vara, digo, ofício, que em resposta [?] ao fato denunciado foram ainda ao diretor do grupo as melhores referências. Todos os documentos [?] vão inclusos a esta. Lastimando que em nosso adiantado Estado existam indivíduos que como o cidadão Dioysio Borges se portam tão impatrioticamente tentando denegrir por meio de denúncias exageradas a mais útil instituição daquela terra – o grupo escolar, felicito-me ao mesmo tempo por ver que o Exmo. Governo do Estado sabe manter a autoridade de seus auxiliares dando-lhes a força e o prestígio de que carecem contra esses insólitos ataques.
Arquivando-se a presente denúncia ficará patente que o Exmo. Governo procura por a salvo de intrigas e perseguição os funcionários que no cumprimento de seus deveres estão ao lado da lei e não fazem concessão de espécie alguma a quem quer que seja.
Saúde e fraternidade.
Ao ilustre cidadão Major
Francisco Pedro do Canto
DD. Inspetor Geral Interino
Justiniano Vianna
Inspetor escolar

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